Transição de carreira – e agora?

Sensação de incompletude, de certo vazio, de desmotivação… É claro que, ao longo de nossas vidas profissionais, passamos por vários momentos de dúvida e de menos ânimo com o trabalho que, não necessariamente, indicam a necessidade de uma mudança brusca de rota.

Mas e quando esses sentimentos persistem?

Quando aquele projeto, área ou mercado que nos enchia os olhos de brilho parece ter perdido a cor para nós ou, ainda mais profundamente, o propósito que, afinal de contas, nos fez querer tanto chegar até lá – seja aquele cargo de liderança com o qual sempre sonhamos, aquele setor no qual batalhamos tanto para conquistar o reconhecimento financeiro e profissional ou mesmo uma empresa pela qual investimos tempo, dinheiro e esforço; não importa, algo em nós diz que é hora de seguir por outros rumos.

Nessas horas, o que fazer? Como dar o próximo passo em uma transição de carreira? Se você está enfrentando esse momento – como, aliás, muitos de meus clientes, mentorados e eu mesma já passei –, saiba, primeiramente, que você não está sozinho.

Uma pesquisa recente divulgada pelo Valor Econômico aponta, por exemplo, que 9 em cada 10 brasileiros querem mudar de emprego em 2024; ao passo que 62% dos profissionais afirmaram desejar fazer uma mudança de carreira em levantamento da EBAC>

Saiba também que não só é comum, como é natural que você vivencie batalhas internas, sensações de medo, insegurança e até culpa. “Como eu cheguei até aqui e agora vou “abandonar tudo?” “E minha estabilidade financeira e respeito que construí depois de anos de trabalho duro?”

Aceite seus processos, mas entenda, antes de tudo, que toda mudança gera resistência, inclusive de nosso ego e vaidades. Compreenda também que não se trata de abandonar – o legado positivo que você construiu não se perde e será preservado nos novos líderes que você inspirou, nos resultados que você construiu e, certamente, nas transformações que você liderou; nesse mesmo sentido, de todas as nossas etapas de carreira levamos aprendizados e, com sorte, amigos e parceiros para uma vida.

Sei disso com base tanto em estudos das tendências de carreira no mercado – que vivencia uma mudança de paradigma (geracional e de valores que, cada vez mais, é ligado a busca pelo propósito e menos a um cargo hierárquico ou mesmo ganhos financeiros exponenciais) –, mas também porque vivi na pele essa transição: depois de anos e tantas conquistas como diretora executiva de grandes empresas, decidi caminhar com mais independência no universo da consultoria e nos processos de mentoring e coaching para lideranças e futuros líderes.

Isso significa dizer que, hoje, não tenho desafios e tudo é plenitude? De modo algum – é importante ser capaz de sonhar, sem perder o realismo. O que sinto, simplesmente, é que me reconectei com meu propósito de apoiar a evolução e o desenvolvimento das pessoas positivamente.

 

Enfrentando os desafios da transição de carreira

Para começarmos a trilhar um caminho em torno dessas questões, é interessante analisarmos algumas estatísticas que demonstram como a pauta da saúde mental se tornou, em maior ou menor grau – pois isso depende da maturidade gerencial e do entendimento dos recursos humanos enquanto uma base estratégica para o sucesso – um vetor para organizações contemporâneas.

Sobre esse ponto, um estudo recente da Deloitte indicou que 80% das corporações encaram o bem-estar dos colaboradores como um elemento central de suas estratégias de negócio; ao passo que 61% das companhias entrevistadas pretendem aumentar os investimentos voltados aos programas de saúde mental.

Por sua vez, um levantamento da FGV indicou que, para enfrentar o dilema de aumento de casos de transtornos psicológicos nas empresas, identificou um aumento na oferta de benefícios nas organizações; enquanto que, segundo reportagem do Portal Mundo RH de 2023, a procura por auxílio psicológico cresceu 44% nas empresas.

 

Liderança inspiradora X Liderança tóxica

Falando de modo mais pessoal, acredito que podemos dividir os desafios dos processos de transição profissional em 3 clusters principais:

Incertezas pessoais: aqui, estou falando de alguns daqueles medos que citei anteriormente; falta de autoconfiança, medo de estar cometendo um equívoco, medo de se ver sozinho(a) e sem apoio e, curiosamente, até medo do sucesso – porque o sucesso em qualquer empreitada (seja uma jornada de descoberta espiritual e filosófica, a retomada de estudos acadêmicos ou uma mudança 360º para outro mercado) – demanda esforço, dedicação e, acima de tudo, comprometimento com o seu propósito.

Planejamento de rota: outro desafio/sentimento comum é o da perda de um norte, de um rumo que nos oriente. Daí que vem as perguntas: “mas como vou fazer isso? O que vou fazer agora?”. Ao mesmo tempo em que se trata de um momento extremamente desafiador, a reflexão sobre essas questões pode ser o impulso essencial para a transformação genuína.

Entendimento de contexto: finalmente, há aquelas dúvidas ligadas ao nosso contexto pessoal e externo. Podemos nos questionar se aquele é o melhor momento para a mudança, ter dúvidas sobre nossa capacidade de sustentarmos financeiramente aquela transição, se o mercado está vivendo um bom momento, etc.

 

Trilhando o caminho do sentido

Todas essas reflexões são fundamentais e partem de nosso processo de entendimento sobre nosso verdadeiro propósito. É importante investigá-las, inclusive, para saber se, de fato, queremos fazer uma transição mais profunda – sair do mundo executivo, abrir (ou vender) um negócio, imergir no mundo da pesquisa, mudar de área, de ares, de estilo de vida… –, ou estamos vivendo um momento de crise passageira motivado por algum contexto pessoal ou de trabalho.

Se, por meio dessa investigação, descobrimos que é mesmo chegada a hora de uma mudança que nos conecte ao sentido de nossas vidas profissionais, há algumas bases de apoio fundamentais para apoiar esse processo:

Transforme a desorientação em planejamento, definindo o que você precisa para mudar, de quanto você precisa e em quanto tempo aquela jornada de transição será trilhada (lembre-se uma mudança não precisa – e geralmente não será – feita do dia para a noite);

Busque apoio – de mentores, terapeutas (para o equilíbrio das emoções) e de especialistas em processos de transição (sim, um sonho que se sonha junto é realidade e, quando há método, ele ainda mais factível);

Faça uma imersão – busque novos conhecimentos sobre o setor/mercado/ponto onde você quer chegar, investindo em cursos e saberes que lhe auxiliarão a ganhar mais segurança para a mudança;

Invista em seu networking e crie novas redes de conexões que podem ser valiosas para a transição;

● E, acima de tudo, respeite seu propósito e o planejamento que trilhou – sim, a mudança não ocorre do dia para a noite, mas, se você já se decidiu, tenha coragem para, em algum momento, mergulhar.

Por fim, meu amigo e precursor dos estudos de accountability no Brasil, João Cordeiro, fala sempre sobre a importância do senso de dono que devemos ter em nossas carreiras. Nesse mesmo sentido, abraçar uma transição é assumir a proa de nossas vidas profissionais, sabendo que os desafios irão existir, mas que aquele é o mar que decidimos navegar.

 

 

Fontes

https://vocerh.abril.com.br/desenvolvimento/62-dos-profissionais-querem-mudar-de-carreira

https://valor.globo.com/carreira/noticia/2023/12/15/nove-em-cada-dez-brasileiros-querem-mudar-de-emprego.ghtml

https://www.cnnbrasil.com.br/economia/tres-em-cada-quatro-profissionais-querem-mudar-de-emprego-em-2023-diz-pesquisa/

https://moveuptalents.com/blogPage.php?idioma=pt&idPaginasBlogs=81